Mais de 35 organizações e movimentos são contrários à cobrança em cursos de pós-graduação na UFSM

 Mais de 35 organizações e movimentos são contrários à cobrança em cursos de pós-graduação na UFSM

No último dia 19 de novembro, a minuta de resolução que prevê a cobrança de taxas e mensalidades em cursos de pós-graduação lato sensu na UFSM foi aprovada pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE), em uma votação que, formalmente, foi encerrada com 25 votos favoráveis à proposta e 23 votos contrários (embora a reitoria não tenha acatado uma solicitação de mudança de voto, o que faria a votação ficar em 25 votos a 24).

Aprovada no CEPE, a minuta chegou à pauta do Conselho Universitário (Consu) no dia 26 de novembro. A discussão naquela instância, contudo, não chegou a ser feita, pois o conselheiro Luiz Boneti, integrante do Diretório Central dos(as) Estudantes (DCE), pediu vista do processo. Agora, a proposta deve ser apreciada na próxima reunião do Conselho, marcada para o dia 17 de dezembro.

A cobrança de taxas e mensalidades na pós-graduação prevista na minuta em questão diz respeito aos cursos lato sensu, ou seja, aqueles ofertados de forma não regular na UFSM.  O assunto vem movimentando as entidades representativas da universidade, que têm buscado apoio junto a movimentos sociais e populares para unir forças contra a proposta, considerada mais um abrir de portas para a privatização do ensino superior público e um recuo à universalidade e à autonomia da instituição.

Ao realizar o pedido de vista no Consu, Boneti argumentou que a minuta de resolução é fortemente repudiada por entidades representativas, e que a diferença entre votos favoráveis (25) e contrários (24) à proposta foi ínfima, quando levada à votação no CEPE. Ou seja, o tema arregimenta opiniões dissonantes, passando longe de ser consenso.  

Prejuízos da proposta

A sociedade brasileira já paga impostos suficientes para que possa ter acesso ao ensino público e gratuito. Essa é a avaliação de Adão Damasceno, Secretário de Carreira e de Relação de Trabalho do Sinasefe Santa Maria. “Queremos uma universidade laica, gratuita e de qualidade. Ao abrirem vagas só para quem puder pagar, esses cursos já irão excluir um bom grupo de pessoas”, ressalta o dirigente, ressaltando que os cursos de especialização lato sensu são bastante relevantes para a colocação profissional em determinadas áreas.

Outra crítica levantada por Damasceno é a carência de um debate coletivo, que abranja toda a comunidade acadêmica, sobre a proposta.

“Uma discussão desse nível deveria abranger mais pessoas, e não só os conselhos superiores. Desde o início nós, do Sinasefe, reunimos com várias entidades e ajudamos a elaborar os documentos [como a carta às e aos conselheiros, e o abaixo-assinado]. Pretende-se também fazer uma audiência”, explica o dirigente, concluindo que a contrariedade não é à aprovação da minuta como um todo, mas aos itens específicos que preveem as cobranças de taxas e mensalidades, dando fim ao princípio de gratuidade na UFSM.

Desigualdade

A exclusão social seria um dos principais retrocessos consequentes de uma possível implementação da proposta. Isso porque a cobrança de taxas em cursos de pós-graduação dificulta o acesso das parcelas sociais economicamente mais vulneráveis da sociedade, que, por vezes, não têm nem como pagar pela própria alimentação. Maurício Fanfa, doutorando em Comunicação Social, integrante da Associação de Pós-Graduandos(as) (APG) da UFSM e relator do pedido de vistas da minuta no CEPE, destaca o papel social que a universidade pública deve desempenhar:

‘’Ela [universidade] é responsável por alavancar o desenvolvimento intelectual, científico e econômico da sociedade. Ela deve fazer isso de maneira estratégica, rigorosa e em benefício da população. Cobrar por cursos oferecidos na universidade pública é abandonar parte desse projeto de universidade. A cobrança em cursos lato sensu eventuais, apesar de legalmente amparada e até comum em outras universidades, contradiz os princípios sobre os quais construímos a universidade pública brasileira.’’

O doutorando também enfatiza outro aspecto problemático da proposta: o início de um processo de privatização e desmanche da universidade, já que a cobrança por cursos lato sensu poderia abrir espaço para que outros projetos de cobrança instalem-se em mais níveis da instituição. Em consonância com esse pensamento, Daniel Ballin, integrante do DCE da UFSM, comenta que ofertar cursos pagos é pôr a universidade pública à disposição das elites, e não da população, como deveria ser.

‘’A cobrança também pode ocasionar a oferta de cursos visando apenas seu potencial de arrecadação e diminuindo a autonomia universitária, pois falsas demandas da moda, sem reflexão sobre a importância e função social de um curso, incentivam uma oferta mercadológica’’, ressalta Ballin.

Importância da mobilização

Graças às mobilizações contra a cobrança na pós-graduação, realizadas por mais de 35 entidades representativas de Santa Maria, a proposta ainda não foi votada. Além da redação do parecer de vistas e da defesa dele frente aos conselhos, Maurício Fanfa expõe outras ações que foram realizadas contra o projeto: protesto em frente à reitoria no dia da sessão do CEPE; assembleia estudantil para discutir o tema; carta aos conselheiros e conselheiras, assinada por entidades, organizações políticas e movimentos sociais da cidade; e um abaixo-assinado, que já coletou mais de 600 assinaturas e pode ser acessado aqui.

Para a próxima reunião do CONSU, Ballin afirma que as entidades sindicais e estudantis já estão entrando em contato com os conselheiros para expor seus pontos de vista em defesa da universidade pública. Junto a essa estratégia, de acordo com o estudante, os movimentos sociais buscam ‘’mobilizar as bases, a fim de discutir o que a comunidade acadêmica pensa sobre o processo, visto que não houve debate e ampla consulta à comunidade acadêmica para justificar interesse em tal proposta. Sem o devido mérito e sem manifestação ampla de interesse por parte da comunidade, não consideramos cabível aprová-la.’’

Bruna Homrich e Laurent Keller

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